O 'choque liberal' por trás da crise de desigualdade em Cuba: 'Vida só melhora para quem tem dólar'
Cuba enfrenta uma crise econômica aguda que acentua desigualdades entre seus cidadãos, com reformas radicalmente liberalizantes que lembram a "terapia do choque" vivida pela Rússia. A situação resulta em inflação elevada, escassez de produtos e um aumento da vulnerabilidade social, afetando principalmente aqueles sem acesso a dólares.
Cuba vive uma profunda crise econômica, com experiências distintas entre vizinhas no bairro de Havana Vieja.
Marina Clary, que hospeda estrangeiros e possui um pequeno comércio, sente a crise de forma menos severa. "Compro em lojas privadas e consigo acesso a produtos que o Estado não oferece", afirma.
Em contrapartida, Claudia Marcelina, arquiteta no governo, vive uma situação precária: "Os preços sobem rapidamente e faltam produtos básicos para a maioria."
Este cenário remete à "terapia do choque" na década de 90 na Rússia, onde reformas rápidas levaram a hiperinflação e desigualdade. Cuba hoje enfrenta uma crise semelhante, exacerbada pela pandemia, pelo embargo dos EUA e pela falta de apoio externo.
O governo cubano adotou medidas impensáveis, como legalização parcial do dólar e estímulo ao setor privado. Isso, no entanto, resultou em inflação acelerada e agravamento das desigualdades sociais.
A economia cubana encolheu 12% desde 2019 e o bloqueio dos EUA causou prejuízos de cerca de US$ 164 bilhões. O turismo, essencial para a economia, reduziu significativamente.
A nova política cambial introduzida pelo governo busca unificar as moedas da ilha, mas desorganiza o sistema de preços. Aine Marcondes Miglioli, especialista em desenvolvimento econômico, destaca a vulnerabilidade do país em meio a essas mudanças.
A desigualdade, que contraria os legados dos irmãos Castro, é crescente. "Aqueles com acesso ao dólar conseguem se beneficiar", explica Omar Everleny Pérez, economista cubano.
Com a inflação oficial acima de 30%, o governo planeja reformas para conter as distorções macroeconômicas e reduzir déficits. No entanto, especialistas alertam que, sem um avanço em direção a um modelo de socialismo de mercado, a crise cubana continuará.
A política e a coesão do Partido Comunista serão fundamentais para determinar o futuro econômico da ilha, num contexto sem a liderança de Fidel Castro.